Não existe sinal de chuva na janela de onde olho o céu. Ao contrário, o céu está azul, sólido, firme, constante e longo. Eu voltei do Encontro de celebração dos 30 anos da Missão Zero com algumas perguntas, mas uma se destaca: como viver como cristão nestes dias?
Ouvi o relato dos missionários que estão Nordeste, na África e na Europa pela Missão Zero. Suas alegrias, dificuldades, a busca pela inserção na cultura, e suas vitórias. Acredito que, junto com cada um de vocês que leem este texto, conhecemos, por outros missionários, as mesmas características que eles relataram. Ouvi os palestrantes. Começando pelos relatos da Europa, Estados Unidos, passando pela África, chegando aos centros urbanos do Brasil, surge outra pergunta que me preocupa muito: estaríamos indo em direção à uma sociedade pós cristã?
Diferente da imagem de minha janela vejo uma sociedade que parece imersa em algo parecido com um dilúvio. A realidade parece estar se diluindo, se tornando liquefeita. O cristianismo não é mais a religião dominante em muitos lugares onde costumava ser, dando lugar a uma visão de mundo secularizada na qual mais e mais pessoas estão vendo a fé cristã como opcional e antiquada, e, até mesmo, como desagradável. O discurso da tolerância parece ser o limitador para todos os discursos, menos o da exclusividade de Cristo. Isto pode ser fruto de uma Igreja e cristãos que perderam sua missão. Substituíram a missão por um projeto de poder, controle, status, vida boa neste mundo e não testemunham mais do amor transformador de Deus. Ao mesmo tempo, se estabelece na sociedade, uma busca da liberdade absoluta, por parte do ser humano. Seria este um movimento pendular, onde a sociedade mundial estaria se movendo em direção à época do mundo pré-cristão? Época onde os cristãos foram perseguidos porque criticaram e não adoraram a César como Senhor (Kyrios) e se recusaram a participar de suas práticas idólatras, que envolviam a exploração dos seres humanos? Estaria a sociedade se revelando como de fato é, sem as amarras culturais que mantinham as aparências? Quais são os Senhores que querem o lugar de Jesus? Mais perguntas surgem enquanto olho para o céu azul!
A igreja (se não estivesse se afogando junto) deveria ser uma espécie de arca, não apenas para os cristãos, mas para todos os que estão perdidos neste dilúvio e se afogando. Você pode estar se perguntando: o que é diferente agora, quando comparamos todas as crises da igreja e da sociedade no passado? Por pior que foram as crises passadas o ocidente ainda tinha uma base espiritual e moral comum para julgar a igreja, a sociedade e o próprio ser humano. Agora não existe mais este balizamento. Não há terra firme, não existe uma âncora para ser jogada e nenhum mapa confiável para ajudar na navegação! O dilúvio parece ter derrubado as paredes do templo e não sabemos o que fazer, estando do lado de fora, com os tijolos, e com as ruinas!
Eu continuo olhando para os céus. Nuvens passam, se unem e dissipam. O céu se fecha e as vezes se abre. O céu se abriu de uma maneira única na história. Olhar para os céus e perceber que eles se abriram e a Vida veio habitar entre nós, é, para mim, o único fato concreto que não se dissolve na realidade construída. A desintegração e a morte foram vencidas!
Não penso que devemos fazer a “cristandade grande outra vez”. Devemos buscar a Deus através de Jesus, permitindo que Ele nos molde, e assim como Cristo, possamos andar de cidade em cidade, de casa em casa, com palavras e atos poderosos. Cristo entrou na realidade humana para regenerá-la; re-criar o criado como a realidade sagrada. Nesta realidade “sem estruturas concretas” devemos relembrar que toda realidade é ordenada e dada por Jesus Cristo. É Ele quem coloca em ordem as emoções, os sentimentos, as preocupações, os valores, os saberes, para se viver. Sem Jesus o ser humano se fragmenta, se dissolve. Encontrar o Jesus revelado é urgente no dilúvio!
Ao mesmo tempo se o cristão não se tornar ativo, intencional e disciplinado em sua vida de fé ele a perderá. A fé cristã é para ser vivida, a conversão ao cristianismo deverá ser profunda e vivida na realidade fragmentada. O discipulado mútuo, onde a oração regular, a adoração, o jejum, a leitura das escrituras e o serviço ao próximo são fundamentais para o crescimento e formação do ser humano. Será necessário enfatizar o estudo intencional, em grupo, dos evangelhos com o intuito de “modelar” a vida dos cristãos no exemplo de Jesus, evitando um Kyrios concorrente. O discipulado é aprender a ser como Jesus! O discipulado deve ser mútuo, pois nenhuma rede social substituirá o rosto, a voz, o toque das pessoas. Uma horizontalidade deve ser estabelecida nas relações humanas.
Dentro desta “comunidade de discípulos” os filhos devem ser criados, ensinados e irão crescer dentro de uma cultura familiar onde aprendem, desde pequenos, o Evangelho da Verdade. As casas são transformadas em “templos onde se vive o evangelho”.
Nestas “casas-templo”, onde se reúne uma “comunidade da graça”, se confia na obra de Jesus para a salvação. Esta comunidade aprende diariamente que não é por esforço humano que somos salvos; mas única e exclusivamente por Jesus. É necessário a lembrança contínua da graça salvadora de Deus! Como pessoas falhas acolhem outras pessoas falhas que juntos buscam a Jesus!
Estes “templos-humanos” são amantes e promotores da paz, da justiça. São acolhedores, misericordiosos, sensíveis, submissos, imparciais e sinceros. Eles saem de suas “casas-templo” como “templo”, como missionários, como imagem e semelhança de Deus para servir ao próximo, a “viúva, ao órfão, o estrangeiro e o pobre”. Eles são como Jesus entre os homens! Eles andam com os olhos no céu aberto, no Reino que está entre nós, transformando a realidade para que todos vejam o céu azul no meio do dilúvio.
Whanderson Perobelli
Ex-coordenador da Missão Zero
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22 e 23 de junho, em Porto Alegre/RS
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24 a 27 de junho, em Florianópolis/SC
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